A Justiça Federal de Roraima determinou que a União promova a exumação dos corpos de indígenas Yanomami vítimas da Covid-19 enterrados em Boa Vista para que seja feito os rituais fúnebres tradicionais das comunidades. A decisão é desta quarta-feira (16).
A decisão é resposta a uma ação movida pelo Ministério Público Federal (MPF) em fevereiro com objetivo de garantir que as comunidades Yanomami e os familiares das vítimas possam fazer os rituais de luto de seus parentes.
Foi estabelecido o prazo de 60 dias para que o procedimento seja feito e que os restos mortais sejam transportados para as comunidades onde as vítimas viviam. A decisão não cita quantos indígenas serão exumados. Os corpos foram sepultados no cemitério Campo da Saudade, no bairro Centenário, zona Oeste de Boa Vista.
Na ordem, o juiz Felipe Bouzada Flores Viana, da 1ª Vara da Justiça Federal, determinou ainda que o governo de Roraima não coloque impedimentos para a realização do processo, que deverá ser feito por empresa contratada pela União e respeitando as medidas de biossegurança.
De acordo com o procurador da República, Alisson Marugal, autor da ação, “ignorar as práticas culturais em momento tão grave para uma família e uma comunidade é agravar a situação de sofrimento”.
“Os Yanomami possuem rituais fúnebres próprios, realizados de acordo com a cultura de cada subgrupo, e a manutenção dos restos mortais em cemitério viola o direito fundamental de luto”, explicou o procurador.
solicitamos posicionamento da União, do Ministério da Saúde e do governo do estado sobre a decisão e aguarda resposta.
A Justiça Federal concordou com o pedido do MPF por entender que o tempo decorrido dos sepultamentos acentua o estágio de decomposição dos cadáveres.
“Além de comprometer a realização dos rituais fúnebres, o período vem prolongando o sofrimento dos familiares, da comunidade e, segundo a ótica tradicional dos yanomami, do próprio morto, impactando indelevelmente a paz social das coletividades indígenas”, disse o MPF.
Antes de entrar com a ação judicial, o MPF recomendou que o Ministério da Saúde, por meio da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e do Distrito Sanitário Especial Indígena Leste (Dsei-Leste), exumassem os corpos, o que não foi acatado.
Indígenas Yanomami vítimas de Covid-19
Os Yanomami que estavam com Covid foram removidos de suas comunidades para Boa Vista por apresentarem complicações graves e, apesar do atendimento hospitalar, morreram em decorrência da doença.
À época, de acordo com o MPF, ainda nos primeiros meses da pandemia, por haver incerteza científica sobre a segurança sanitária da remoção de restos mortais, a Defesa Civil de Roraima elaborou norma proibindo a população indígena de realizar seus rituais fúnebres, prevendo tão somente a exumação dos corpos após o fim da pandemia.
Questionado, o Governo de Roraima responsável pela Defesa Civil, informou que “está à disposição da União, no que diz respeito ao aparelhamento do Estado, de forma que se cumpra a decisão judicial”.
O MPF em dezembro de 2021, baseado em pareceres favoráveis do Instituto Médico-Legal de Roraima e da Vigilância Sanitária de Boa Vista, emitiu uma recomendação aos Distritos Sanitários Especiais Indígenas do Leste de Roraima e Yanomami para que realizassem o processo de exumação e transferência dos restos mortais de indígenas enterrado sem autorização das comunidades.
No entanto, a Secretaria de Saúde Indígena (Sesai), que coordena e supervisiona a saúde indígena, negou acatamento à recomendação, alegando risco epidemiológico para as comunidades indígenas e falta de atribuição para custear o processo de exumação e devolução dos corpos.
Em entre maio e junho de 2020, dois bebês Yanomami foram enterrados em Boa Vista sem autorização da família. Esta etnia possui um ritual próprio de cremação na floresta. Depois de cuidar das cinzas durante um ano, fazem o ritual tradicional.