A Rússia reuniu mais de 100 mil soldados perto da fronteira com a Ucrânia nas últimas semanas, segundo estimativas dos Estados Unidos, levantando temores de oficiais de inteligência do Ocidente e ucranianos de que uma invasão poderia ser iminente.
À medida que os esforços diplomáticos frenéticos são feitos para evitar a guerra, os analistas alertam que as forças armadas da Rússia representam uma ameaça imediata à Ucrânia.
Mas se uma invasão ocorresse, não está claro por onde começaria. A Rússia criou pontos de pressão em três lados da Ucrânia – na Crimeia, ao sul, no lado russo da fronteira entre os dois países e em Belarus, ao norte.
Aqui estão as três frentes que a Ucrânia e o Ocidente estão observando, e os recentes movimentos russos detectados em cada uma delas.
Leste da Ucrânia
A maior atenção foi dada às regiões separatistas de Donetsk e Luhansk, onde forças ucranianas e separatistas apoiadas pela Rússia estão em conflito desde 2014.
A principal suposição daqueles que observam os movimentos russos é que Moscou poderia aumentar o poderio militar que já possui na região, tornando o leste da Ucrânia a posição mais fácil para lançar uma invasão.
Imagens de satélite obtidas pela CNN mostram que uma grande base em Yelnya, que continha tanques, artilharia e outros blindados russos, foi amplamente esvaziada, com o equipamento aparentemente sendo movido para muito mais perto da fronteira nos últimos dias.
Grandes quantidades de armamento foram transferidas para a base no final de 2021 antes de desaparecer – incluindo cerca de 700 tanques, veículos de combate de infantaria e lançadores de mísseis balísticos.
Vídeos que circulam pelas redes sociais desde então mostram alguns desses equipamentos em trens e estradas muito mais ao sul na região de Bryansk, que fica perto da Ucrânia. A blindagem e os veículos são identificáveis das mesmas unidades que foram posicionadas anteriormente em Yelnya.
Stephen Wood, diretor sênior da empresa americana de imagens de satélite Maxar, disse à CNN: “Parece-me que uma quantidade considerável de veículos [tanques, artilharia autopropulsada e outros veículos de apoio] partiu do parque de veículos do nordeste; veículos blindados adicionais partiram do parque de veículos mais central [da base de Yelnya].”
Enquanto isso, a atividade vista nos oblasts [subdivisão administrativa da Rússia] de Kursk e Belgorod, que fazem fronteira com o nordeste da Ucrânia, aumentou as preocupações.
“Estamos vendo um fluxo maciço de veículos e pessoal em Kursk”, alertou Konrad Muzyka, especialista em rastreamento de movimentos militares da Rochan Consulting, no Twitter.
Phillip Karber, da Fundação Potomac em Washington, que também estudou detalhadamente os movimentos de tropas russas, disse à CNN este mês: “A mais forte formação ofensiva da Rússia – a 1ª Divisão de Tanques da Guarda, que normalmente fica estacionada na área de Moscou – foi movida 400 quilômetros para o sul e está se reunindo na área ideal para uma ofensiva blindada rápida na rota de invasão Kursk-Kiev.”
Belarus
As preocupações também aumentaram em relação ao vasto acúmulo de tropas russas em Belarus, um país intimamente ligado a Moscou que poderia fornecer outro caminho para a Ucrânia.
A Rússia e Belarus iniciaram 10 dias de exercícios militares conjuntos na quinta-feira passada, cuja dimensão e timing despertou temores no Ocidente.
Acredita-se que o deslocamento de Moscou em Belarus seja o maior desde a Guerra Fria, com “estimados 30 mil soldados de combate, forças de operações especiais Spetsnaz, caças incluindo SU-35, mísseis de capacidade dupla Iskander e sistemas de defesa aérea S-400”, disse o secretário-geral da OTAN, Jens Stoltenberg, em 3 de fevereiro.
É também o maior exercício que as forças armadas de Belarus realizaram em qualquer época do ano, de acordo com o Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS).
O Ministério da Defesa da Rússia afirmou que o objetivo dos exercícios, chamados “Allied Resolve-2022”, incluía repelir “agressão externa”.
Alguns temem que o acúmulo de força militar na região indique um plano russo de avançar em direção a Kiev pelo norte.
Um diplomata europeu disse à CNN no início deste mês que a concentração de forças é uma “grande, grande preocupação”, observando que essa seria a peça que faltava para Moscou lançar um ataque rápido à capital ucraniana.
Os exercícios conjuntos também forneceriam cobertura para um movimento de flanco através da Bielorrússia e no norte da Ucrânia, alerta o CSIS.
E imagens de satélite divulgadas pela Maxar parecem mostrar que os militares da Rússia têm avançado seus destacamentos em vários locais de Belarus.
As movimentações provavelmente estão ligadas aos exercícios conjuntos, mas outras fotografias mostram campos sendo estabelecidos perto da fronteira com a Ucrânia, a centenas de quilômetros de onde os exercícios estão ocorrendo.
No entanto, se a Rússia se concentrar na fronteira de Belarus como seu ponto de entrada para a Ucrânia, a rota estaria repleta de dificuldades.
Soldados russos teriam que contornar os pântanos de Pinsk, também conhecidos como pântanos de Pripet, uma das maiores áreas alagadas da Europa, que fica na fronteira entre Belarus e a Ucrânia – um terreno denso, alagado e densamente florestado que se estende por 269 mil quilômetros quadradas.
Essa região impediu o avanço das forças nazistas durante a Operação Barbarossa, a condenada invasão da União Soviética pela Alemanha, em 1941.
De acordo com o Institute for the Study of War, “os pântanos podem ser difíceis, em alguns lugares provavelmente impossíveis, para forças mecanizadas atravessarem quando molhados”.
Crimeia
A península anexada pela Rússia em 2014 forneceria um cenário natural para qualquer nova operação, mas não está claro se Moscou tentaria lançar um movimento para a Ucrânia a partir da Crimeia.
Um grande deslocamento de tropas e equipamentos foi observado pela Maxar, que avalia que mais de 550 tendas de soldados e centenas de veículos chegaram ao norte da capital da Crimeia, Simferopol.
Em seguida, uma nova movimentação foi identificada pela Maxar pela primeira vez na última quinta-feira perto da cidade de Slavne, na costa noroeste da Crimeia, incluindo veículos blindados.
Esses novos destacamentos militares foram observados no mesmo dia em que vários navios de guerra russos chegaram a Sebastopol, o principal porto da Crimeia.
O Ministério da Defesa da Rússia publicou imagens na quinta-feira de seis grandes navios de assalto anfíbios no porto.
A Marinha da Ucrânia respondeu que “a Rússia continua a militarizar a região do Mar Negro, transferindo navios de desembarque adicionais para pressionar a Ucrânia e o mundo”.
As forças navais da Ucrânia “estão prontas para o desenvolvimento de quaisquer cenários e provocações, para defender o país do mar”, acrescentou.
Qualquer movimento para o sul da Ucrânia poderia ser auxiliado por tropas na Transnístria, a região separatista da Moldávia apoiada pela Rússia, onde também foi relatado um aumento de presença militar.
Analistas do CSIS dizem que as tropas russas poderiam tentar um golpe de Estado em Odessa, uma cidade portuária ucraniana a noroeste da Crimeia, “navegando seus navios anfíbios direto para o porto de Odessa e se movendo diretamente para a cidade”.
Ele chama esse movimento de “um alto ganho, mas também uma operação de alto risco”. Odessa é uma cidade bem povoada e o combate urbano ali favoreceria aqueles que a defendem, enquanto as forças russas precisariam eliminar as defesas aéreas da Ucrânia e depois se unir às tropas que chegam do leste do país.